Na Biblioteca Municipal Vicente Campinas e com a presença do autor José Carlos Barros, poeta e escritor galardoado com o primeiro prémio da editora Leya, foi ontem, 8 de janeiro, inaugurada a exposição de pintura «Ficções» que estará permanente até ao próximo dia 31 de janeiro.
A exposição apresenta desenhos a lápis de cor ou a pastel e tinta industrial «quase como se fosse um diário de ausências e memórias do que não existe ou está noutro lugar». São dezoito quadros, e alguns deles podem ser adquiridos, têm preço que pode ser consultado.
José Carlos Barros proferiu algumas palavras de apresentação da sua exposição. Começou por dizer que «expormos nem sempre é coisa muito fácil, muito agradável. Depois, ainda por cima, está associado a uma coisa que é, quando nos expomos, é porque achamos que o que fazemos merece o olhar das outras pessoas. E isso, por vezes, também nos deve recomendar alguma prudência. Não deixa de ser sempre um bocadinho, um atrevimento, fazer estas coisas».
Acrescentou que «Sejam grandes ou pequenas obras, eu levo a escrita a sério, portanto, quando escrevo um livro, quer dizer o que lá está, enfim, é aquilo que eu consegui fazer e, portanto, investi nisso seriamente».
Referindo-se à sua ação nas artes plásticas disse que «o caso do desenho, da pintura, é diferente porque é uma espécie de divertimento e de coisa, que está sempre um bocadinho ao lado. E agrada-me às vezes, embora nem sempre as pessoas percebam isso, porque isto ao referir-se à pintura, também não é uma coisa muito para o público».
Depois destas breves palavras, José Carlos Barros apresentou os quadros e explicou os respectivos motivos. «Este aqui chama-se Resident 1909. Eu gosto muito de pintura. E fui apaixonado por um quadro do Kirchner que se chama Dresden. Bem, a partir daí eu fiz um desenho que já não tem nada a ver com o quadro original, mas onde me apeteceu meter 1909. Tem ali umas pessoas do lado direito no quadro. Aqui está a chover. Do outro, não chove e, portanto, são os jogos destes».
E, mudando para outro «Ficamos sempre um bocado fascinados com Marrocos. Aquilo é uma, enfim, interpretação de Tetuan, que eu fiz com base em algumas fotografias que tirei, especulando de tal maneira que, às tantas, os prédios já são letras. Já é um a um B ou 19, ou umas palavras que estão ali bem escondidas.»
E ainda outro «Ali está um, a partir de uma fotografia, uma radiografia aos pulmões».
Falou depois sobre o seu processo de pintura, das tintas mais ou menos baratas que utiliza para a elaboração dos seus quadros, do uso dos materiais reciclados. Deteve-se num quadro «Sítio do Alto», «Uma coisa que eu conheço há muitos anos que passo ali a pé, por razões que me interessam, agora quase diariamente, e ver todos os dias chaminés de mestre a cair. Coisas de boa arquitetura a cair, e nós sabemos depois o que é que vai substituir sempre estas coisas, que é a má arquitetura».
Aproveitou, então, para falar da preservação, dizendo que «O património, não é só aquela coisa que vem de trás e nós devemos proteger isto, que é muito bom, sem percebermos muito bem que o património é feito a cada ano. Quer dizer, eles, quando fizeram aquelas coisas, estavam a fazer património e nós, neste momento, não estamos a fazer património para o futuro. Fez-se na primeira metade do século com as multibandas com as chaminés, e neste momento não se está a fazer e, portanto, é uma tristeza»
Revelou, a seguir, que, quando teve um problema de coração e depois começou a andar a pé, o ter descoberto esse fascínio, que classifica agora como uma coisa maravilhosa. Percebeu também que as coisas são vistas de outra maneira e reparou que nunca as tinha visto, as coisas à volta da sua própria casa.
«Anos e anos, nunca as tinha visto. Comecei a ver as abas das chaminés, os pormenores das platibandas, etc. É uma tristeza perceber que quase de quinze em quinze dias cai uma chaminé. Se calhar, caem quatro ou cinco e no Algarve, ao todo, devem cair umas quinze ou vinte por semana ou de 15 em 15 dias. Estão todas a desaparecer. Portanto, a pintura também serve um bocado para isso».
José Carlos Barros teve a assistir, para além do público, os responsáveis da Biblioteca Municipal e todo o staff institucional da cultura, na autarquia de Vila Real de Santo António.
Fernando Horta, vereador, classificou a exposição e o trabalho do autor como «uma base clara, disruptiva de um processo inquieto de criação, que é de alguém que observa delicadamente, aquilo que anda e aquilo que se encontra à sua volta, e tem esta capacidade, acho que já comparada com Aquilino».